quinta-feira, 16 de outubro de 2014

O UIVO DA GÓRGONA PARTE 15


Dessa vez foram ainda mais cautelosos ao sair. Jonas levantara a gôndola e empurrar para o lado as coisas que haviam caído – barbeadores, pilhas, colas rápidas. Queria o corredor desempedido caso precisassem voltar rapidamente.
A rua agora estava vazia. O rapaz com camiseta de rock havia desaparecido e provavelmente havia se juntado ao grupo, se o tivesse alcançado.
- Por ali. – orientou Edgar.
Passaram pela casa fechada que Edgar havia visto antes. O barulho lá dentro continuava. Som de móveis quebrados atravessavam o portão.
- Deviam estar com a casa trancada quando aconteceu. – explicou Jonas. Acho que não conseguem abrir portas e grades.
Edgar concordou:
- O instinto deles é sair e se juntar à multidão. Como não conseguem, estão destruindo a casa.
Quando chegaram à frente da casa, Edgar estancou:
- Deixei encostado. O portão não estava aberto dessa forma.

O UIVO DA GÓRGONA PARTE 14


O garoto continuava seu caminho, lenta, mas decididamente. Não demoraria para encontrar com Edgar. Então ouviu-se um barulho alto, na rua.
Edgar abriu os olhos e arriscou olhar por entre os salgadinhos.
O zumbi parara, indeciso. Por um instante, pensou continuar na mesma direção. Então houve outro barulho e ele se virou completamente, naquele momento estranho, dos braços esticados ao longo do corpo e imóveis.
Edgar esticou a cabeça. Havia duas latas de leite caídas do lado de fora, abertas com seu conteúdo branco manchando o asfalto negro.
O rapaz foi até elas, intrigado, ficou ao lado delas, olhando à volta por alguns instantes, depois se afastou até sair da vista.
Jonas se aproximou, por entre as prateleiras:
- Melhor irmos agora.

O UIVO DA GÓRGONA PARTE 13


Era rapaz de não mais de 17 anos. Tinha cabelos negros e compridos, pouco abaixo dos ombros. Usavam uma camisa preta de banda de rock e calças jeans. Tinha perdido o tênis all star de um dos pés, parecia não se preocupar com isso. Andava de uma maneira estranha, que seria engraçada em outra situação: mantinha os braços junto ao corpo, a cabeça balançando levemente, os cabelos indo e vindo, como se estivesse num show.
Ela parou na entrada, como um cachorro que fareja o ar, mas na verdade buscava algum som. Edgar rezou para que a menina não chorasse.
Uma embalagem de pilhas desabou da gôndola caída, chamando sua atenção. Ele andou lentamente até ela: agora, ao movimento de vai de vai acrescentara outro: um girar de um lado para o outro, como uma câmera de vigilância.
Após um momento de indecisão, ele avançou pelo corredor no fim do qual estavam Edgar e Sofia.
Edgar fechou os olhos e rezou.

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

O uivo da Górgona - parte 12




Pareceu uma eternidade, como se o tempo tivesse parado ou fosse um filme em câmera lenta. Jonas se virou para eles  fez um gesto para que voltassem. Edgar levou alguns segundos para obedecer, mas antes olhou para a rua.
Um zumbi solitário estava lá. Parecia perdido, como se sentisse a ausência da solidão. Olhava para o outro lado e parecia não tê-los percebido.
Edgar segurou a menina pela mão e a puxou para o fundo da mercearia. Estava quase de volta ao local onde se escondera antes, entre os salgadinhos e os refrigerantes, quando ouviu um barulho atrás de si. Girou a cabeça e olhou por cima dos ombros. Jonas tinha derrubado uma gôndola. Ela se manteve num movimento instável e finalmente caiu, com um estrondo.
(oh, não, barulho chama eles como imã – intuiu)
Ainda como se estivesse em câmera lenta, ele se escondeu no mesmo local de antes. Olhou em volta e não encontrou Jonas.
Foi quando o zumbi entrou.

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

O uivo da Górgona - parte 11



A menina voltou a fazer gestos.
- Ela está apontando para o caderno em cima do balcão. – alertou Edgar.
- Deve estar querendo escrever algo. Vou pegar o caderno e a caneta.
Edgar lamentava não ter aprendido linguagem de surdos e mudos. Esse tinha sido oferecido aos professores na universidade e ele deixara para outro momento. Talvez agora fosse tarde demais.
Jonas voltou com o caderno e a caneta e entregou para a menina. Ela escreveu nele e entregou e mostrou aos dois:
“Meu nome é Sofia”
Depois voltou a escrever:
“Eles vão voltar”
- Ela tem razão. – concordou Edgar. Não podemos ficar escondidos aqui para sempre. Precisamos tentar contato com outras pessoas, descobrir se isso aconteceu em toda a cidade.
- Não consegui sintonizar nenhuma estação no rádio. Estão todas fora do ar. A televisão também não funciona.
- Tentou ligar par alguém?
- Meu celular descarregou e não tenho fixo.
Edgar sabia que seu celular estaria com bateria. Sempre o desligava antes de dormir. Começara a fazer isso depois que um aluno lhe ligou a uma da manhã para fazer uma pergunta sobre um trabalho. Além disso, tinha o telefone fixo.
- Precisamos ir para minha casa. Tenho telefone lá. Moro aqui perto.
Saíram em fila indiana, um atrás do outro, por entre as prateleiras.
- Oh, não! – disse Jonas, estancando. Voltem, rápido!

O uivo da Górgona - parte 10



- Não sei quem é a garota. – disse Jonas. Ela estava andando na rua, perdida e desesperada e eu a trouxe para dentro pouco antes de encontrar você. Não sei nem mesmo seu nome e não sei como ela não se transformou em uma daquelas coisas.
- A menina se virou para eles e começou uma série de gestos com as mãos.
- Ela é surda-muda. – concluiu Edgar.
Isso explicava porque ela não havia sido afetada. Ela não ouvira o barulho infernal.
- Ela não ouviu o uivo da Górgona.
Jonas enrugou a testa:
- Como?
- As górgonas eram criaturas da mitologia grega que tinham o poder de transformar as pessoas em pedras.
- A Medusa.
- É a mais famosa delas. Eram três irmãs: Medusa, Esteno e Euríale. Por alguma razão me lembrei delas. Esse som transforma as pessoas.
- Essas pessoas estão sendo transformadas em algo muito pior. – garantiu Jonas.
Edgar sabia disso. Tinha visto com seus próprios olhos. A imagem da menina lambendo o dedo sangrento como se fosse uma guloseima talvez nunca saísse de sua retina.