quarta-feira, 3 de setembro de 2014

O uivo da Górgona - parte 12




Pareceu uma eternidade, como se o tempo tivesse parado ou fosse um filme em câmera lenta. Jonas se virou para eles  fez um gesto para que voltassem. Edgar levou alguns segundos para obedecer, mas antes olhou para a rua.
Um zumbi solitário estava lá. Parecia perdido, como se sentisse a ausência da solidão. Olhava para o outro lado e parecia não tê-los percebido.
Edgar segurou a menina pela mão e a puxou para o fundo da mercearia. Estava quase de volta ao local onde se escondera antes, entre os salgadinhos e os refrigerantes, quando ouviu um barulho atrás de si. Girou a cabeça e olhou por cima dos ombros. Jonas tinha derrubado uma gôndola. Ela se manteve num movimento instável e finalmente caiu, com um estrondo.
(oh, não, barulho chama eles como imã – intuiu)
Ainda como se estivesse em câmera lenta, ele se escondeu no mesmo local de antes. Olhou em volta e não encontrou Jonas.
Foi quando o zumbi entrou.

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

O uivo da Górgona - parte 11



A menina voltou a fazer gestos.
- Ela está apontando para o caderno em cima do balcão. – alertou Edgar.
- Deve estar querendo escrever algo. Vou pegar o caderno e a caneta.
Edgar lamentava não ter aprendido linguagem de surdos e mudos. Esse tinha sido oferecido aos professores na universidade e ele deixara para outro momento. Talvez agora fosse tarde demais.
Jonas voltou com o caderno e a caneta e entregou para a menina. Ela escreveu nele e entregou e mostrou aos dois:
“Meu nome é Sofia”
Depois voltou a escrever:
“Eles vão voltar”
- Ela tem razão. – concordou Edgar. Não podemos ficar escondidos aqui para sempre. Precisamos tentar contato com outras pessoas, descobrir se isso aconteceu em toda a cidade.
- Não consegui sintonizar nenhuma estação no rádio. Estão todas fora do ar. A televisão também não funciona.
- Tentou ligar par alguém?
- Meu celular descarregou e não tenho fixo.
Edgar sabia que seu celular estaria com bateria. Sempre o desligava antes de dormir. Começara a fazer isso depois que um aluno lhe ligou a uma da manhã para fazer uma pergunta sobre um trabalho. Além disso, tinha o telefone fixo.
- Precisamos ir para minha casa. Tenho telefone lá. Moro aqui perto.
Saíram em fila indiana, um atrás do outro, por entre as prateleiras.
- Oh, não! – disse Jonas, estancando. Voltem, rápido!

O uivo da Górgona - parte 10



- Não sei quem é a garota. – disse Jonas. Ela estava andando na rua, perdida e desesperada e eu a trouxe para dentro pouco antes de encontrar você. Não sei nem mesmo seu nome e não sei como ela não se transformou em uma daquelas coisas.
- A menina se virou para eles e começou uma série de gestos com as mãos.
- Ela é surda-muda. – concluiu Edgar.
Isso explicava porque ela não havia sido afetada. Ela não ouvira o barulho infernal.
- Ela não ouviu o uivo da Górgona.
Jonas enrugou a testa:
- Como?
- As górgonas eram criaturas da mitologia grega que tinham o poder de transformar as pessoas em pedras.
- A Medusa.
- É a mais famosa delas. Eram três irmãs: Medusa, Esteno e Euríale. Por alguma razão me lembrei delas. Esse som transforma as pessoas.
- Essas pessoas estão sendo transformadas em algo muito pior. – garantiu Jonas.
Edgar sabia disso. Tinha visto com seus próprios olhos. A imagem da menina lambendo o dedo sangrento como se fosse uma guloseima talvez nunca saísse de sua retina.